sexta-feira, 29 de novembro de 2013

BIOGRAFIA DE CLARICE LISPECTOR



                        
      Clarice Lispector nasceu na Ucrânia, na aldeia Tchetchenilk, no ano de 1925. Os Lispector emigraram da Rússia para o Brasil no ano seguinte, e Clarice nunca mais voltou á pequena aldeia. Fixaram-se em Recife, onde a escritora passou a infância. Clarice tinha 12 anos e já era órfã de mãe quando a família mudou-se para o Rio de Janeiro. Entre muitas leituras, ingressou no curso de Direito, formou-se e começou a colaborar em jornais cariocas. Casou-se com um colega de faculdade em 1943. No ano seguinte publicava sua primeira obra: “Perto do coração selvagem”. A moça de 19 anos assistiu à perplexidade nos leitores e na crítica: quem era aquela jovem que escrevia "tão diferente"? Seguindo o marido, diplomata de carreira, viveu fora do Brasil por quinze anos. Dedicava-se exclusivamente a escrever. Separada do marido e de volta ao Brasil, passou a morar no Rio de Janeiro. Em 1976 foi convidada para representar o Brasil no Congresso Mundial de Bruxaria, na Colômbia. Claro que aceitou: afinal, sempre fora mística, supersticiosa, curiosa a respeito do sobrenatural. Em novembro de 1977 soube que sofria de câncer generalizado. No mês seguinte, na véspera de seu aniversário, morria em plena atividade literária e gozando do prestígio de ser uma das mais importantes vozes da literatura brasileira.
 Obra:
 O objetivo de Clarice, em suas obras, é o de atingir as regiões mais profundas da mente das personagens para aí sondar complexos mecanismos psicológicos. É essa procura que determina as características especificas de seu estilo.
O enredo tem importância secundária. As ações - quando ocorrem - destinam-se a ilustrar características psicológicas das personagens. São comuns em Clarice histórias sem começo, meio ou fim. Por isso, ela se dizia, mais que uma escritora, uma "sentidora", porque registrava em palavras aquilo que sentia. Mais que histórias, seus livros apresentam impressões. Predomina em suas obras o tempo psicológico, visto que o narrador segue o fluxo do pensamento e o monólogo interior das personagens. Logo, o enredo pode fragmentar-se. O espaço exterior também tem importância secundária, uma vez que a narrativa concentra-se no espaço mental das personagens. Características físicas das personagens ficam em segundo plano. Muitas personagens não apresentam sequer nome. As personagens criadas por Clarice Lispector descobrem-se num mundo absurdo; esta descoberta dá-se normalmente diante de um fato inusitado - pelo menos inusitado para a personagem. Aí ocorre a “epifania”, classificado como o momento em que a personagem sente uma luz iluminadora de sua consciência e que a fará despertar para a vida e situações a ela pertencentes que em outra instância não fariam a menor diferença. Esse fato provoca um desequilíbrio interior que mudará a vida da personagem para sempre.
Para Clarice, "Não é fácil escrever. É duro quebrar rochas. Mas voam faíscas e lascas como aços espelhados". "Mas já que se há de escrever, que ao menos não se esmaguem com palavras as entrelinhas". "Minha liberdade é escrever. A palavra é o meu domínio sobre o mundo."

 Romances:
 Perto do Coração Selvagem, RJ, A Noite, 1944.
Lustre, RJ, Agir, 1946.
A Cidade Sitiada, A Noite, 1949.
A Maçã no Escuro, RJ, Francisco Alves, 1961.
A Paixão Segundo G.H., RJ, Francisco Alves, 1964.
Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres, RJ, Sabiá, 1969.
A Hora da Estrela, RJ, José Olympio, 1977.

 Contos e crônicas:
 Laços de Família, RJ, Francisco Alves, 1960.
A Legião Estrangeira, RJ, Ed. do Autor, 1964.
Felicidade Clandestina, RJ, Sabiá, 1971.
A Imitação da Rosa, RJ, Artenova, 1973.
A Via-Crucis do Corpo, RJ, Artenova, 1974.
A Bela e a Fera, RJ, Nova Fronteira, 1979.

Literatura infantil:

Mistério do Coelho Pensante, RJ, J. Álvaro, 1967.
A Vida Íntima de Laura, RJ, Sabiá, 1974.
A Mulher que Matou os Peixes, RJ, Sabiá, 1969.
Quase de Verdade, RJ, Rocco, 1978.

"Meus livros felizmente para mim não são superlotados de fatos,
e sim da repercussão dos fatos nos indivíduos.
Eu me refugiei em escrever. Acho que consegui devido a uma vocação bastante forte e uma falta de medo ao ser considerada
diferente no ambiente em que vivia."

“Com sete anos eu mandava histórias e histórias para a seção infantil que saía às quintas-feiras num diário. Nunca foram aceitas."

OBRA INFANTIL DE CLARICE LISPECTOR

A literatura de Clarice Lispector para crianças, com sensibilidade quase maternal, cria um clima de aconchego e conforto, como se a cada vez que as páginas do livro fossem abertas, as crianças leitoras se sentissem como que entrando na sala de visitas da casa da autora e fossem ouvir uma história bem criativa com todo aquele ar de intimidade. Como se a história fosse contada por alguém bem próximo e bem querida: a mãe, a tia, a avó, o pai, etc. Alguém em quem a criança confiasse “sentar” ao lado para ouvir uma historinha e deixando-se levar pela narração. Isto está bem evidente na hora em que a narradora, em “A mulher que matou os peixes” diz:
 “Sabem de uma coisa? Resolvi agora mesmo convidar meninos e meninas para me visitarem em casa. Vou ficar tão feliz que darei a cada criança uma fatia de bolo , uma bebida bem gostosa, e um beijo na testa.”

O clima de intimidade, próprio para ganhar confiança vem do modo como ela “dialoga” com  criança através da obra. Como no mesmo livro “A Mulher que Matou os Peixes”, logo no início antes de contar a história vem a frase:

“Antes de começar, quero que vocês saibam que meu nome é Clarice. E vocês, como se chamam? Digam baixinho o nome de vocês e meu coração vai ouvir.”
 E esse recurso estilístico se repete várias vezes. As digressões ou os supostos diálogos da narradora com o leitor predominam em relação às ações da própria narrativa. Clarice Lispector parecia estar ciente de como penetrar no Universo Infantil de modo seguro e que não fizesse em momento algum com que o pequeno leitor se sentisse ‘sozinho’ ao ler a história – na verdade, a impressão de que a narradora é uma companhia está muito presente, tal a intimidade oferecida pelo texto. Como em uma das passagens de “O Mistério do Coelho Pensante”, a confiança a ser conquistada é uma prioridade. E pode-se estabelecer uma analogia:

“Coelho é como passarinho: se assusta com carinho forte demais, fica sem saber se é por amor ou por raiva. A gente tem que ir devagar para ele ir se acostumando, até que ele ganha confiança.”
(MCP)
 Da mesma forma a narradora começa a narrativa aos pouquinhos, sempre fazendo intervenções ao longo dela até que o leitor se veja completamente  envolvido, e, isso também é muito característico de sua obra direcionada à camada adulta. Numa linguagem simples e recheada por onomatopéias, metáforas, aliterações e outros recursos de linguagem, suas fábulas encontram meios de profunda identificação com a criança. Em “O Mistério do Coelho Pensante”, Joãozinho, é um coelho que pensa e tem idéias brilhantes e que ninguém sabe de onde vêm, e, por isso permanecem os “mistérios” do começo ao fim do livro. Laura, de “A Vida Íntima de Laura”, também pensa. Apesar de “burrinha”, tem “pensamentozinhos e sentimentozinhos”, e até cacareja assim: “Não me matem! Não me matem!” Ulisses de “Quase de Verdade” é o cachorro que “poupa” o trabalho de Clarice ao contar a história, ou melhor, de ser o narrador. É sabido, bonito e com seu “au- au-au” expressa tudo o que está sentindo, achando ou pensando. Só em “A mulher que matou os peixes” que não existem animais falantes e é também, juntamente ao “Quase de Verdade”, o único livro infantil de Clarice Lispector – entre os outros quatro livros citados – narrados em primeira pessoa o tempo todo. Têm um narrador protagonista que conta os fatos através das memórias de suas experiências. E parece também, que em “A Mulher que Matou os Peixes”, que ela alcança maior empatia com os leitores –mirins. Nesta obra, a narradora se “expõe totalmente” em busca da justificação do crime que traria sua absolvição por ter matado os peixes. Mas, em geral, as narrativas apresentam uma linguagem muito próxima à da criança, seja com suas repetições de idéias ou termos quando deseja frisar algum tópico importante e nem sempre encontra recurso adequado para isso. Essas repetidas vezes são responsáveis pela facilidade com que as passagens são entendidas e interpretadas pelas crianças.
São narrativas simples e que mesmo tendo alguma ação se concentram – a exemplo de suas narrativas para adultos – muito mais nos “aspectos psicológicos” das personagens fantásticas. Nessa mistura de fantasia e realidade, o íntimo de cada personagem é sondado por uma análise meticulosa ou o uso de uma linguagem tão próxima à criança que torna essa “análise” feita por ela própria. As ações parecem ser meros pretextos para o desenvolvimento de uma minuciosa – obviamente muito mais ‘descomplicada’ – análise de um perfil psicológico dentro da história, sem deixar, mais uma vez, de comparar essa problemática de sua obra infantil com sua obra para adultos.
Essas fábulas, assim como as todas as demais, uma vez ou outra podem ter um cunho moralizante: como em Laura, a galinha, que apesar de ser muito feia e burra tem um grande coração, aliás clichê aludindo ao fato da beleza interior ser mais importante do que a exterior:

“A verdade é que Laura tem o pescoço mais feio que já vi no  mundo.  Mas você não se importa, não é? Porque o que vale mesmo é ser bonito por dentro.”
(VIL)

Em “Quase de Verdade”, também a nuvem Oxélia deixa ao final da história de ser ruim ao chover. Sua cor preta de nuvem carregada de chuva torna-se branca como nuvenzinha de verão. Assim também como o cachorro Bruno mata o cachorro Max, em “A Mulher que Matou os Peixes”, num acesso de ciúmes pelo dono. Acaba sendo morto pelos outros cachorros da vizinhança em ‘vingança’ algum tempo depois. Todas essas histórias são baseadas em fábulas originais, mas com um toque todo pessoal de Clarice Lispector.


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